segunda-feira, 29 de setembro de 2014

vida na sacada

Claro que não tenho nenhuma ilusão de produzir, numa hortinha de sacada, vegetais suficientes para encher a geladeira.

Claro que é muito bom poder colher, de vez em quando, uns temperinhos frescos para dar mais sabor à comida... mas cultivar alimentos em casa é muito mais do que apenas questão de abastecimento da cozinha.

Plantar é um ato de resistência. É uma afronta, ainda que silenciosa, a um sistema que transforma toda produção em indústria e todo alimento em mercadoria e não em dádiva da terra.

Plantar é romper com uma cultura de cosmética alimentar, em que até legumes e verduras precisam se adequar a padrões de beleza "anabolizados" impostos pelo mercado. Cultivar alimentos em casa exige que se entenda que a aparência dos vegetais é o que menos importa.

Plantar é uma terapia. Os ciclos da terra, tão diferentes da nossa rotina atabalhoada e cada vez mais veloz, são lentos e exercitam a nossa paciência. E ressaltam a importância do cuidado: muita água, pouca água, muito sol, pouco sol, aquele grilo maroto... muitas coisas podem matar a sua plantinha.

E plantar é, também, uma lição. Esses pequenos seres que habitam o microcosmo restrito de um vaso na sacada nos ensinam que a vida é um troço complicado e que há muitas coisas nesse mundo que não podemos controlar.

Veja, por exemplo, o caso do nosso pé de alho-poró.

Deixei brotar um bulbo de alho-poró comprado no supermercado, seguindo uma receita que encontrei na internet (para ler o post, clique aqui). O broto crescia lindamente e só lá pelo quarto dia depois do transplante para o vaso me dei conta de que poderia registrar em fotos o seu progresso diário:

Dia 4:



Dia 5:



Dia 6:






















Que danadinho que cresce rápido, não?

Bem, no sétimo dia, o pequeno pé de alho-poró começou a morrer.

E eu não faço ideia do que aconteceu. Em dois dias, era uma haste seca e quase cinza caída sobre a terra. Seria excesso de sol? Seria água demais? Seria um fungo ou um inseto aproveitador?

Não sei. Tentar cultivar vegetais na selva de pedra é aprender a importância do cuidado permanente e do respeito a uma Natureza que é maior do que nós. E também exige a compreensão de que a vida é complexa e não se deixa dominar pelo nosso planejamento.

Perder um dos seus bebês vegetais é frustrante. Mas a agricultura de apartamento é um exercício de perseverança. Que também traz grandes alegrias, como o nosso frondoso pé de manjericão:




sexta-feira, 11 de julho de 2014

manifesto: eu quero menos

Eu não quero a vida que querem pra mim.

Não quero o sucesso, a realização, a riqueza e o prazer sem limites que me oferecem os anúncios, os livros de autoajuda, os consultores de carreira, os filmes e até algumas igrejas.

Eu não quero ser o número 1, nem o número 2, nem o número 10 mil — não quero ser um número. Não quero ser melhor que o colega de trabalho que senta ao meu lado. Não quero chegar ao topo; deve ser muito triste e solitário lá, já que “só há lugar para os melhores”. Não quero estar entre os melhores — não entre os que são considerados melhores pelos analistas de RH.

 Não quero ver o Outro como um rival por um lugar ao sol; quero antes convidá-lo a plantar uma árvore e aproveitar a sombra comigo. Quero a solidariedade como visão de mundo e postura frente à vida.

Quero que o meu trabalho ajude a tornar o mundo um lugar melhor, mas quero, sobretudo, que o meu trabalho seja apenas um trabalho. Quero que minha vida seja mais do que metas, reuniões e prazos criados para dar mais dinheiro a pessoas que já têm dinheiro demais.

Também não quero que o meu trabalho me enriqueça. Quero é ter uma vida digna e descobri que não preciso fazer horas extras nem ser promovido para isso. Pelo contrário. Eu não quero mais; eu quero menos.

Não quero o carro mais possante, a roupa da marca mais famosa, o maior apartamento no bairro mais caro. Não quero comprar a felicidade na forma de mil coisas que não preciso ter — quero é buscar a harmonia e, eventualmente, encontrá-la.

Quero, mesmo vivendo na cidade, recuperar a conexão perdida com o tempo ancestral, com os ciclos da vida e com os humores da Mãe Terra. Uma vida em que o relógio seja menos importante que os momentos vividos é o que almejo.

Talvez não consiga tudo que quero — mas tudo bem, não jogo pelas regras do sistema e minha vida é mais que uma checklist. Querer esse outro caminho e caminhar por ele já é chegar lá.